quarta-feira, 23 de dezembro de 2009

Madrugada aos pés do Naranjo

Acordei com um dia cinzento lá fora.
Vim escrever para uma encosta, abrigado do vento forte. Um imenso mar de nuvens é a minha paisagem.
Ontém à noite tinha estado um frio considerável e hoje de manhã mantém-se. O vento continua a soprar forte o que faz aumentar a sensação de desconforto.
Os meus companheiros dormem, recuperando do esforço da subida de ontém e eu vou observando os grupos que saiem em direcção ao Torre Cerredo, o ponto mais alto do Parque Nacional dos Picos de Europa.
Atrás de mim está o Naranjo de Bulnes ou como se diz em asturiano o Pico Urriellu. Sempre majestoso. Uma meca da escalada em Espanha e dos poucos pontos para esta actividade existentes dentro do perímetro do parque.
O nome Naranjo vem exactamente da tonalidade alaranjada da rocha que o compõe, e Bulnes, por ser a aldeia habitada que fica mais próxima.
Ontém à noite por momentos o nevoeiro dissipou deixando-o ladeado por milhares de estrelas e iluminado apenas pelo reflexo da Lua. Foi um momento inesquecível, vê-lo pela primeira vez e logo tão de perto. Foram os mais belos breves segundos das minhas viagens até então.
Depois de um dia inteiro a subir pelo meio do nevoeiro, com uma visibilidade tão reduzida que estivemos a 15/20 metros de duas camurças sem que elas se apercebecem da nossa presença, ter oportunidade de o ver naquelas condições foi um previlégio.
Só conseguimos identificar o nosso destino final pelo som do gerador do Refúgio de la Vega de Urriellu. Nunca aquele barulho irritante nos pareceu tão doce.
Dormir neste local foi uma sensação magnífica. O jantar, temperado com uma geada forte, que se acumulava em forma de gelo no nosso cabelo, foi partilhado à entrada da tenda e não há nenhuma descrição que possa dar noção da sensação desse momento. Tem de ser vivido, para se poder compreender.
As rajadas de vento continuam e as nuvens negras começam a acumular lá no alto.
Surge mais um nevoeiro repentino que vai encobrindo as tendas e as pequenas ilhas de gelo que ainda subsistem nas encostas desde o último nevão.
Um boião de maçã é a primeira parte do pequeno-almoço. É não, já foi!
Agora, upa! Vamos lá ver se eles já acordaram.

Nota: Esta crónica foi escrita antes de existir o funicular que dá acesso à aldeia de Bulnes. Até há bem pouco tempo (2001) só se tinha acesso a pé por um trilho estreito.

4 comentários:

Rui Lança disse...

Confirmo :) É um local espectacular e o Tiago lá me deu a conhecer aquelas zonas. Foi em...2001!

Tiago Viana disse...

Pois foi.
Quando estava a escrever a crónica, coloquei na parte do funicular "até há bem pouco tempo", depois lembrei-me que foi em 2001... O tempo passa depressa. Já lá voltei algumas vezes depois disso.
Bons tempos. Bons não, maravilhosos.
Este ano quero ver se dou lá um salto. É um pouco como rever um amigo.
Abraço Rui.

Inês disse...

São destas sensações que todos deveriam usufruir, pelo menos uma vez na ida. Tu és um privilegiado. E eu tb.

*

Tiago Viana disse...

Já foste aos Picos?
Relativamente perto e em termos de turismo na natureza na Peninsula Ibérica é do melhor.