segunda-feira, 30 de agosto de 2010

Albergues

A experiência vivida no alojamento marca muito uma viagem.
A sua escolha (local e tipologia), caracteriza o tipo de viajante que somos, o que procuramos, a nossa atitude e modela os nossos comportamentos.
Numa travessia a solo é o ponto de encontro, o local de socialização após um dia, ou vários dias sozinho, o local de conforto, por muito pequeno que este seja.
Satisfaz a nossa necessidade quase inata de nos abrigarmos durante a noite.
Assim, muitas das histórias que temos das nossas viagens são passadas aí, entre quatro paredes, sejam elas de madeira, pedra ou pano.
“Albergava” eu em Pamplona, quando eis se não quando me entra uma equipa de reportagem na cozinha para registar imagens do albergue.
Cá para mim ainda vamos aparecer num programa sobre o Caminho de Santiago. - penso para comigo.
Logo hoje que estou cansado, com olheiras da viagem e de óculos postos.
Bem, é da maneira que não me filmam. Ninguém quer filmar um caixa-de-óculos!
Felizmente saíram rapidamente. A última coisa que quero é uma câmara apontada à cara e responder a perguntas sobre a razão de estar ali. Já basta os que me perguntam “A pé? Para quê? Vai de carro que é mais rápido e vês o mesmo.”
Vejo mesmo? Será? E sentir faz parte de ver?
Bom, mas a cozinha de um albergue é o local multicultural por excelência.
Reparem, todos tomamos duche da mesma maneira (uns mais que outros é certo), todos ressonam da mesma forma (uns mais que outros é certo), mas a alimentação, mesmo na Era da Globalização, ainda é distinta de país para país, de continente para continente. O horário também. Quando os Asiáticos, Nórdicos e os viajantes oriundos da Europa Ocidental e Central vão dormir, chegam os Espanhóis para começar a preparar calamares e falar naquele ritmo alucinante.
Na mesa do lado estão dois casais de coreanos. Uma das senhoras cozinha uma massa de arroz cozido espalmado e passado pela frigideira para os outros três. São uma espécie de aperitivos segundo me parece. Fica interessada no meu refogado e diz que cheira bem. Insiste para que coma aquela espécie de panqueca. Aceito e provo uma. É agradável. Mas volto à minha massa, apesar da insistência da senhora. Cá para mim fez arroz a mais e quer despachar isto. Ou então está farta de arroz e quer uma massa com tempero mediterrânico para variar.
Na mesa da frente, duas raparigas francesas comem “sushi campista”, ou seja, atum em lata. O cheiro é inconfundível.
O português, não podendo levar os chouriços, os queijos e o “casqueiro”, leva o azeite para “temperar” as saudades.
Bom, mas é hora de me ir deitar e ouvir a sinfonia dalguns companheiros de quarto. Com a barriga cheia vamos lá ver se não fazemos uma rapsódia.

10 comentários:

Anónimo disse...

Delicioso, o posto claro :)
Pronto, o atum também!

Rui Lança disse...

Gostei muito...há aí uma veia a explorar caro Amigo! Pensa nisso...

Abraço,

rl

Tiago Viana disse...

Obrigado pelos vossos comentários.
Abraço

Moces Marafades disse...

A autenticidade e a excelente descrição fazem-nos sentir que estamos mesmo para "lá do trilho" e deixam saudades de te poder escutar também pessoalmente:))))

Abraços do Algarve
Vanda e Tó

Tiago Viana disse...

Marafades!!!
Estão vivos!!!
Temos de nos encontrar para colocar a conversa em dia e já agora comer um marisco algarvio para ajudar a ter tema de conversa.
Abraços lisboetas

ines.ipg disse...

quem vê tanta comida e tantos cheiros diferentes todos os dias enjoa... ainda hoje vi 2 alemaes FRITAREM!!!!! Bacalhau à Brás pré cozinhado :S credos! deixei-os estar ... :D

VagaMundos disse...

Isso é que foi reunir os ingredientes certos para este post: a perspicácia do caminhante Tiago Viana, as idiossincrasias dos povos, um albergue "lotado" e multicultural e uma escrita bem divertida. Excelente!!!
Abraço

Tiago Viana disse...

Inês, tu contactas todos os dias com isso, por isso certamente terás muitas situações engraçadas para contar. Um dia escreves um livro com tudo.
Meu rico bacalhau à bráz...

Vagamundos, vocês percebem esta sensação muito bem, não só pelas viagens, mas também pela vossa experiência de vida no estrangeiro. Lembro-me do vosso artigo sobre o regresso a casa ou visitas de familiares.

Obrigado a ambos pelas vossas palavras e por ainda me lerem :)

SirKeeper disse...

Buenas Tiago!

veo que sigues con tus viajes.

Muy bueno lo de los españoles comiendo calamares :)
Para tu información los mejores bocadillos de calamares se comen en Madrid. Ya los probarás cuando vengas.

Desconocía que las latas de atún son el "sushi" del camping jajjajaa

Un Abrazo.

Tiago Viana disse...

Hola Paco.
Tengo de ir a Madrid a comer los calamares e un vino de La Rioja.
Un abrazo.